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MPF diz que mineração na Serra do Curral sem aval do Ibama é ilegal

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O Ministério Público Federal (MPF) moveu uma ação civil pública para obrigar a mineradora Tamisa a solicitar anuência prévia do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) antes de realizar qualquer supressão vegetal na Serra do Curral, considerada cartão postal de Belo Horizonte. De acordo com os procuradores à frente do processo, por se tratar de área de Mata Atlântica, o desmatamento é ilegal caso ocorra sem a avaliação e o aval do órgão ambiental federal.

“O complexo, com previsão total de supressão vegetal de 101,24 hectares, está integralmente inserido no bioma Mata Atlântica, no ecótono com a vegetação de Cerrado, na Serra do Curral, monumento natural integrante da Reserva da Biosfera Serra do Espinhaço. Nas regiões a serem suprimidas, foram identificadas diversas espécies raras, endêmicas e ameaçadas de extinção”, registra a ação, divulgada hoje (31) pelo MPF.

A implantação de um complexo minerário da Tamisa na Serra do Curral tem sido alvo de diferentes contestações judiciais. A prefeitura de Belo Horizonte reclama que deveria ter sido consultada. Embora esteja próximo ao limite com a capital mineira, o empreendimento será instalado na cidade de Nova Lima, que atestou a conformidade do projeto em fevereiro desse ano. Esse aval dado pelo município vizinho é inclusive foco de questionamento do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que vê desrespeito da legislação urbanística. O argumento, no entanto, não foi acolhido em decisões preliminares.

Uma outra ação movida pelo MPMG aponta vícios de legalidade no processo de licenciamento do complexo minerário, entre eles, a ausência de consulta efetiva às comunidades do entorno, a falta de pesquisas essenciais à segurança hídrica e ambiental e a inexistência de estudos relacionados à Política Estadual de Segurança de Barragens. Há ainda processos movidos pelo partido Rede Sustentabilidade e por pessoas físicas.

O licenciamento do complexo foi concedido no fim do mês passado pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam), órgão colegiado consultivo e deliberativo vinculado à Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Semad). O placar final terminou em 8 a 4 pela liberação do empreendimento. Todos os quatro representantes de órgãos vinculados ao governo mineiro, incluindo a Semad, se manifestaram de forma favorável à mineradora. Por sua vez, os seis conselheiros indicados por entidades da sociedade civil se dividiram.

Também não houve consenso entre os representantes dos órgãos federais com assento no Copam. A Agência Nacional de Mineração (ANM), que responde pela fiscalização do setor no país, votou pela concessão do licenciamento. Já o Ibama, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, manifestou-se contra.

Danos irreparáveis

A ação movida pelo MPF aponta violação do Decreto nº 6.660/2008, que dispõe sobre a proteção da Mata Atlântica. O artigo 19º fixa a necessidade de autorização do Ibama em algumas situações onde houver supressão de vegetação primária ou secundária em estágio médio do avançado de regeneração. O aval do órgão ambiental federal, em geral, é necessário quando 50 hectares for removido. Mas em regiões metropolitanas, deve-se pedir anuência para a supressão de 3 hectares ou mais.

Antes de mover a ação, o MPF chegou a emitir, no início do mês, uma recomendação para que a Tamisa solicitasse a anuência prévia do Ibama. Em resposta recebida no dia 16 de maio, a mineradora informou discordância com a demanda apresentada, afirmando ter cumprido as obrigações ambientais e as medidas exigidas pelos órgãos estaduais.

A Mata Atlântica é um bioma presente em 17 estados brasileiros. Atualmente, restam apenas 12,4% da vegetação que existia originalmente no país segundo dados da Fundação SOS Mata Atlântica, organização não governamental que atua em defesa do meio ambiente desde 1986.

De acordo com o MPF, o empreendimento da Tamisa provocaria danos irreparáveis pois afetaria principalmente a formação de Mata Atlântica denominada de campo rupestre, que é de difícil recuperação e abriga espécies que não se encontram fora de Minas Gerais. Além disso, segundo os procuradores, o estudo de impacto ambiental anexado ao processo de licenciamento prevê supressão de nascentes e repercussões para a fauna, a flora, os corpos d’água, a qualidade do ar, o nível de ruído e as propriedades do solo.

Antes mesmo de o projeto entrar na pauta do Copam, ambientalistas realizaram diferentes protestos em Belo Horizonte. No dia em que o licenciamento foi aprovado, o assunto se tornou um dos mais discutidos nas redes sociais.

Pesquisadores do projeto Manuelzão, vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e integrantes do movimento Tira o Pé da Minha Serra temem que a atividade minerária cause graves danos ao bioma local, impacte a disponibilidade hídrica e libere partículas de poeira capazes de afetar a qualidade do ar na região centro-sul da capital mineira.

A Semad tem sustentado que o processo de licenciamento envolveu amplos estudos técnicos e que a empresa terá que cumprir compensações ambientais e florestais. Procurada pela Agência Brasil para comentar o processo movido pelo MPF, o órgão respondeu que “o governo de Minas não comenta ações judiciais e se manifesta nos autos do processo”.

A Tamisa também foi contatada, mas não deu retorno. A mineradora mantém um vídeo de três minutos em seu site onde afirma que informações distorcidas vêm sendo disseminadas sobre o seu projeto e alega que o perfil da Serra do Curral não será afetado.

“A interferência nos recursos hídricos será mínima, sem rebaixamento do lençol freático e sem afetar a vazão das três nascentes envolvidas. O projeto não terá barragem de rejeitos e sua implantação se dará em harmonia e equilíbrio com a fauna e a flora, contando com robustos programas de manejo e conservação de espécies ameaçadas. Os efeitos de poeira, ruído e vibração ficarão restritos à área do projeto”, diz o vídeo.

Patrimônio

Além de abrigar grande diversidade de espécies de fauna e flora, a Serra do Curral também é referência histórica e geográfica de Belo Horizonte. Em sua encosta, há vestígios arqueológicos remanescentes do antigo arraial de Curral Del Rei, que foi escolhido para dar lugar a Belo Horizonte no final do século 19. A decisão levou em conta a beleza natural da região, a condição climática e a riqueza hídrica.

Em 1995, a Serra do Curral foi escolhida símbolo da capital mineira em um plebiscito organizado pela prefeitura, superando a Igreja São Francisco de Assis, a Lagoa da Pampulha, a Praça da Liberdade e outras referências da cidade. Para estimular o ecoturismo na região, foi criado em 2012 o Parque da Serra do Curral. Abrangendo uma área de 400 mil metros quadrados, ele atrai interessados em fazer trilhas e conta com 10 mirantes.

Desde 1960, a Serra do Curral é considerada patrimônio histórico e artístico nacional. No entanto, apenas um trecho foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) – tendo como eixo central a Avenida Afonso Pena, o trecho se estende 900 metros à esquerda e à direita. Na prática, protegeu-se apenas a vista a partir de Belo Horizonte. Essa proteção foi reiterada em 1991, com o tombamento, pela prefeitura de Belo Horizonte, de toda a porção inserida nos limites da capital.

Mas a preservação das porções situadas em municípios vizinhos como Nova Lima e Sabará depende de um tombamento pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha). Um processo com esse objetivo teve início em 2018 e o dossiê final já foi concluído, mas ainda resta pendente de apreciação pelo Conep (Conselho Estadual do Patrimônio Cultural).

Com base nesse processo, o MPMG já havia, em maio do ano passado, contestado o avanço da avaliação do licenciamento do projeto da Tamisa.

Para os promotores, a Serra do Curral deveria estar resguardada até a conclusão da votação que poderá selar seu reconhecimento definitivo como patrimônio de Minas Gerais. Além disso, eles apontaram que, desde 1960, outras incursões minerárias de menor porte já deixaram suas marcas. “A Serra do Curral já ostenta gigantescas cicatrizes da mineração, que impactam negativamente a beleza cênica da paisagem e compromete a integridade do conjunto histórico e arqueológico”, registra a ação.

O empreendimento da Tamisa não é o único na região que vem sendo questionado judicialmente por afetar o patrimônio. Ontem (30), a Justiça deu prazo de 72 horas para que o governo mineiro e a mineradora Gute Sicht expliquem a exploração na Mina Boa Vista. Segundo ação movida pela prefeitura de Belo Horizonte, a atividade não foi licenciada e ocorre em área da Serra do Curral tombada pela capital mineira.

Edição: Lílian Beraldo

Fonte: EBC Geral

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Ação Social

No primeiro ano de governo, 24,4 milhões deixam de passar fome

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Insegurança alimentar e nutricional grave cai 11,4 pontos percentuais em 2023, numa projeção a partir de informações da Escala Brasileira de Segurança Alimentar (EBIA), divulgada pelo IBGE com base na PNAD Contínua

Cozinhas solidárias, programas de transferência de renda, retomada do crescimento e valorização do salário mínimo compõem a lista de ações que contribuem para a redução da fome no país. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

No Brasil, 24,4 milhões de pessoas deixaram a situação de fome em 2023. O número de pessoas que enfrentam a insegurança alimentar e nutricional grave passou de 33,1 milhões em 2022 (15,5% da população) para 8,7 milhões em 2023 (4,1%). Isso representa queda de 11,4 pontos percentuais numa projeção feita a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), divulgada nesta quinta-feira, 25 de abril, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O amplo conjunto de políticas e programas sociais reunidos no Plano Brasil Sem Fome, a retomada do crescimento da economia e a valorização do salário mínimo são alguns fatores que recolocam o país em lugar de destaque da agenda de combate à fome no mundo. Tirar o Brasil novamente do Mapa da Fome é do presidente Lula” Wellington Dias, ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome

Na coletiva de imprensa para divulgação do estudo, o ministro Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome), avaliou que o avanço é resultado do esforço federal em retomar e reestruturar políticas de redução da fome e da pobreza. “O amplo conjunto de políticas e programas sociais reunidos no Plano Brasil Sem Fome, a retomada do crescimento da economia e a valorização do salário mínimo são alguns fatores que recolocam o país em lugar de destaque da agenda de combate à fome no mundo. Tirar o Brasil novamente do Mapa da Fome é do presidente Lula”, disse.

Para o ministro, o grande desafio agora é incluir essas 8,7 milhões de pessoas que ainda estão em insegurança alimentar grave em políticas de transferência de renda e de acesso à alimentação. “Vamos fortalecer ainda mais a Busca Ativa”, completou Dias, em referência ao trabalho para identificar e incluir em programas sociais as pessoas que mais precisam.

PESQUISA — As informações divulgadas nesta quinta são referentes ao quarto trimestre do ano passado. Foram obtidas por meio do questionário da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA). O ministro lembrou que o governo passado não deu condições ao IBGE para realizar a pesquisa. Por isso, a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan) aplicou o EBIA com metodologia similar à do IBGE em 2022, quando o Brasil enfrentava a pandemia de Covid-19 e um cenário de desmonte de políticas, agravado por inflação de alimentos, desemprego, endividamento e ausência de estratégias de proteção social. Esse estudo chegou ao número de 33,1 milhões de pessoas em segurança alimentar grave na época.

A secretária extraordinária de Combate à Pobreza e à Fome do MDS, Valéria Burity, lembra que mesmo em comparação aos resultados de 2018, último ano em que o IBGE fez o levantamento formal, os números apresentados nesta quinta são positivos. À época havia 4,6% de domicílios em insegurança alimentar grave. Agora são 4,1%, o segundo melhor resultado em toda a série histórica do EBIA.

“Estamos falando de mais de 20 milhões de pessoas que hoje conseguem acesso à alimentação e estão livres da fome. Esses resultados mostram o acerto de uma estratégia de enfrentamento à fome que vem sendo empreendida pelo governo, que é apoiada tanto em programas sociais como na condução de uma política econômica que gera crescimento econômico, reduz desigualdades e gera acesso a emprego e renda”.

Esses resultados mostram o acerto de uma estratégia de enfrentamento à fome que é apoiada tanto em programas sociais como na condução de uma política econômica que gera crescimento econômico, reduz desigualdades e gera acesso a emprego e renda” Valéria Burity, secretária extraordinária de Combate à Pobreza e à Fome do MDS 

Valéria também destacou como ponto importante da estratégia de combate à fome a retomada da governança de segurança alimentar pelo Governo Federal, com garantia de participação social. “O presidente Lula e o ministro Wellington foram responsáveis pela retomada do Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional, a restituição do Conselho de Segurança Alimentar e da Câmara de Segurança Alimentar, com 24 ministérios que têm a missão de articular políticas dessa área. E, no fim do ano passado, foi realizada a Conferência de Segurança Alimentar e Nutricional”, relatou.

A secretária nacional de Avaliação, Gestão da Informação e Cadastro Único do MDS, Letícia Bartholo, ressaltou o retorno da parceria do governo com o IBGE. “Depois do período da fila do osso, em que o Brasil viveu muita miséria e fome, uma das primeiras ações do MDS nessa nova gestão foi buscar o IBGE para retomar a parceria e medir a insegurança alimentar dos brasileiros”, recordou.

SUBINDO – A proporção de domicílios em segurança alimentar atingiu nível máximo em 2013, (77,4%), tempo em que o país deixou o Mapa da Fome, mas caiu em 2017-2018 (63,3%). Em 2023, subiu para 72,4%. “Após a tendência de aumento da segurança alimentar nos anos de 2004, 2009 e 2013, os dados obtidos em 2017-2018 foram marcados pela redução no predomínio de domicílios particulares que tinham acesso à alimentação adequada. Em 2023 aconteceu o contrário, ou seja, houve aumento da proporção de domicílios em segurança alimentar, assim como redução na proporção de todos os graus de insegurança alimentar”, explicou André Martins, analista da pesquisa.

 

Dados apontam a evolução da segurança alimentar no Brasil

 

NOVO BOLSA FAMÍLIA — Entre os fatores que contribuíram para o avanço apontado pela pesquisa do IBGE, está o novo Bolsa Família, lançado em março de 2023, que garante uma renda mínima de R$ 600 por domicílio. O programa incluiu em sua cesta o Benefício Primeira Infância, um adicional de R$ 150 por criança de zero a seis anos na composição familiar. O novo modelo, com foco na primeira infância, reduziu a 91,7% a pobreza nesta faixa etária. A nova versão do programa inclui, ainda, um adicional de R$ 50 para gestantes, mães em fase de amamentação e crianças de sete a 18 anos.

BPC – O ministro Wellington Dias também ressaltou a proteção social gerada pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC), que garante um salário mínimo para pessoas aposentadas, pensionistas e com deficiência em situação de vulnerabilidade social. “Vale mencionar que o efeito econômico da Previdência e do BPC foi potencializado pelo esforço administrativo de reduzir as filas de espera para acesso aos benefícios”, disse.

MERENDA – Outra política de combate à pobreza e à fome, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) garante refeições diárias a 40 milhões de estudantes da rede pública em todo o país e foi reajustado em 2023, após cinco anos sem aumento.

PAA – O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) é um dos 80 programas e ações que compõem a estratégia do Plano Brasil Sem Fome. Ele assegura produção e renda aos agricultores familiares, com compra direta dos produtos para serem distribuídos na rede socioassistencial, de saúde, educação e outros equipamentos públicos. Com a participação de 24 ministérios, o Plano cria instrumentos para promover a alimentação saudável contra diversas formas de má nutrição.

ECONOMIA – No cenário macroeconômico, houve um crescimento do PIB de 2,9% e o IPCA calculado para o grupo de alimentos caiu de 11,6% em 2022 para 1,03% em 2023. É a menor taxa desde 2017.  O mercado de trabalho ganhou força e a taxa de desemprego caiu de 9,6%, em 2022, para 7,8% no ano seguinte. A massa mensal de rendimento recebido de todos os trabalhadores alcançou R$ 295,6 bilhões, maior valor da série histórica da PNAD-C.

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