Nacional

Tragédia de Mariana: Justiça suspende exigências impostas a atingidos

Publicado

em

O desembargador José Amilcar Machado, presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), suspendeu exigências impostas para adesão ao sistema online criado para a indenização de atingidos do rompimento da barragem da mineradora Samarco, ocorrido em 2015.

A decisão vale para os moradores de Naque (MG), mas o Ministério Público Federal (MPF) já informou que solicitará a extensão dos seus efeitos para as demais cidades.

A contratação obrigatória de advogado particular, a assinatura de um termo de quitação integral e a renúncia de outras ações judiciais que pleiteiam verbas indenizatórias estão entre os requisitos considerados ilegais pelo desembargador. Para ele, os valores que estão sendo pagos foram definidos de forma aleatória e devem ser encarados como uma antecipação da indenização. A contratação do advogado passa a ser facultativa.

Se for estendida para atingidos das demais cidades, a decisão traz impactos significativos para o processo reparatório. Assinada na terça-feira (21), a medida atende parcialmente pedidos formulados por cinco instituições de Justiça: MPF, Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Defensoria Pública da União (DPU) e defensorias públicas estaduais de Minas Gerais e do Espírito Santo.

“O recebimento de valores indenizatórios qualificados como médios, definidos aleatoriamente em processo cuja decisão foi proferida pouco tempo após o recebimento da petição inicial ,somente podem resultar em quitação parcial, ou seja, os pagamentos realizados em conformidade com a tutela de urgência, concedida na decisão que se pretende suspender parcialmente, devem ser considerados como adiantamento de indenização (piso-mínimo indenizatório)”, escreveu Machado.

Ruptura da barragem

A ruptura da barragem, localizada no município mineiro de Mariana, liberou uma avalanche de rejeitos que alcançou o Rio Doce e escoou até a foz, causando diversos impactos socioambientais e socioeconômicos, além de 19 mortes. O sistema indenizatório online, batizado de Novel, foi criado em 2020, cerca de cinco anos após a tragédia que afetou dezenas de cidades de Minas Gerais e do Espírito Santo.

A gestão de todas as ações de reparação ficaram a cargo da Fundação Renova, entidade que é mantida com recursos da Samarco e de suas acionistas Vale e BHP Billiton. Ela foi criada em 2016, atendendo a termo de transação e ajustamento de conduta (TTAC) firmado entre as três mineradoras, o governo federal, os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. Mais de 40 programas ficam sob sua responsabilidade, entre eles o de indenização individual.

A atuação da Fundação Renova, no entanto, é bastante criticada por comissões de atingidos e por instituições de Justiça. O MPMG chegou a pedir judicialmente sua extinção, alegando que a entidade não goza da devida autonomia frentes às mineradoras.

A morosidade dos programas também motivou questionamentos judiciais: a reconstrução das duas comunidades destruídas em Mariana até hoje não foi concluída. Em julho de 2020, relatório da Ramboll, uma das consultorias externas independentes que assessoram o MPF, apontava que apenas um terço das famílias cadastradas em toda a bacia do Rio Doce haviam recebido alguma indenização.

A implantação do Novel foi saudada pela Fundação Renova como uma solução para destravar o processo indenizatório, possibilitando reconhecer como atingidos trabalhadores informais que tinham dificuldades de comprovar os danos. Por outro lado, recebeu críticas do MPF. O sistema desdobrou-se de decisões de primeiro grau, assinada pelo juiz Mário de Paula Franco Júnior. As primeiras delas, de setembro de 2020, abarcavam moradores de Naque (MG) e Baixo Guandu (ES). Posteriormente, novas sentenças englobaram residentes em outras 42 cidades.

Mário de Paula fixou valores, que variam de R$ 71 mil a R$ 161,3 mil, para indenização de artesãos, carroceiros, lavadeiras, pescadores de subsistência e informais, areeiros e outros. O sistema também indeniza categorias formais como pescadores profissionais, proprietários de embarcações e empresas como hotéis, pousadas e restaurantes. O valor mais alto é R$ 567,5 mil, para proprietários de embarcação camaroeira.

Adesão ao Novel

A adesão ao Novel deveria ser feita na plataforma online pelo advogado que estivesse representando o atingido. Eles poderiam cobrar até 10% da indenização a título de honorários. Em sua decisão, o desembargador José Amilcar Machado pontuou que a contratação de advogado particular deve ser considerada facultativa e que a Fundação Renova tem obrigação de disponibilizar ao atingido uma assessoria jurídica gratuita, conforme consta na cláusula 37 do TTAC firmado em 2016.

Ele também menciona que o MPF incluiu nos autos relatos de episódios envolvendo ameaças e coações e avaliou que há atingidos em situação de hipervulnerabilidade. “Aceitaram todas as obrigações impostas, inclusive as que são reputadas ilegais, uma vez que se encontravam em estado de absoluta necessidade dos valores, fechando, assim, acordos estando desprovidos de real autonomia”, escreveu.

A decisão também dá respaldo para que atingidos possam buscar indenização no Reino Unido, onde fica a sede da BHP Billiton. Nos tribunais ingleses, tramita uma ação em que o escritório PGMBM representa milhares de atingidos e diversas prefeituras e empresas, além da Igreja Católica. A desistência desse processo era um pré-requisito para ingressar no Novel.

Segundo os últimos dados divulgados pela Fundação Renova, da sua criação até abril desse ano, o Novel já permitiu a destinação de R$ 6,01 bilhões para 59,5 mil pessoas. Os valores correspondem a 74,9% de todas as indenizações individuais pagas desde a tragédia.

Procurada pela Agência Brasil, a Fundação Renova informou que por enquanto não vai se pronunciar sobre a decisão do presidente do TRF-1. A Samarco adotou a mesma postura. Em nota, a mineradora disse que “não foi intimada e, por isso, não vai comentar”.

Controvérsias

Entre diversas críticas à implantação do Novel, o MPF questiona porque não foi intimado pelo juiz Mário de Paula para atuar como fiscal da lei, uma vez que o assunto envolve direitos coletivos. Os processos de Naque e Baixo Guandu correram em sigilo. Recursos foram movidos pelo MPF, nos quais foram contestados alguns valores fixados e o recebimento de ações ajuizadas por comissões de atingidos sem representatividade e sem legitimidade.

Como a Fundação Renova celebrou as decisões, levantou-se a suspeita de lide simulada, que ocorre quando o processo é aberto após acordo prévio entre advogados de ambas as partes. No entanto, os recursos anteriores apresentados pelo MPF não obtiveram sucesso .

Na cidade de Mariana (MG), o Novel gerou uma situação singular. O município foi um dos últimos incluídos no sistema.

Surpresa

A medida pegou o MPMG de surpresa porque, diferentemente do que ocorria em todas as demais cidades da bacia do Rio Doce, as indenizações dos atingidos de Mariana vinham sendo tratadas na Justiça estadual. Até então, os pagamentos eram feitos pelo Programa de Intermediação Mediada (PIM). Uma das principais diferenças do processo de Mariana é que a Justiça Estadual determinou que o cadastramento das famílias não fosse realizado pela Fundação Renova e sim pela Cáritas, entidade escolhida pelos atingidos para prestação de assessoria técnica.

Em maio, Marino D’Ângelo, produtor rural e integrante da comissão dos atingidos de Mariana disse à Agência Brasil que a maioria dos que sofreram os maiores danos recusa-se a aceitar os valores oferecidos no âmbito do Novel. “Para quem não teve que correr da lama, que não teve a casa ou as terras duramente afetadas, as quantias podem ser bem-vindas. Mas vejo que a Samarco e suas acionistas Vale e BHP Billiton estão usando esse sistema de indenização para divulgar números fabulosos e estimular aqueles atingidos da linha de frente a aderir. Alguns cederam e aderiram, mas é uma proposta de exclusão. Não cobre 10% do meu prejuízo”.

A Cáritas chegou a preparar uma cartilha listando preocupações com algumas características do sistema Novel. O documento chamava a atenção para a exigência de assinatura de termo quitação total e integral e para a impossibilidade de apresentar contraproposta, já que os valores foram tabelados pelo juiz.

Mas no PIM, muitas negociações também estão travadas. A Fundação Renova trabalha com valores distintos daqueles que foram fixados na matriz de danos dos atingidos, elaborada pela Cáritas com base em consultorias de instituições de pesquisa. Sem perspectiva de evolução, o MPMG ajuizou, em outubro do ano passado, uma ação contra a Samarco, a Vale e a BHP Billiton. Foi pedida a destinação imediata de R$ 2,54 bilhões para indenizar as cerca de 1,3 mil famílias de Mariana cadastradas pela Cáritas.

Repactuação

Com a suspensão da validade dos termos de quitação integral, atingidos já indenizados no Novel podem pleitear novos pagamentos para a reparação dos danos sofridos, aumentando o passivo já existente. Segundo o  Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há cerca de 85 mil processos judiciais relacionadas à tragédia em tramitação no país.

Em busca de uma solução para esse quadro, atualmente está em curso uma mediação que pode levar a uma repactuação de todos os esforços de reparação. O CNJ está conduzindo esse trabalho.

A expectativa do MPF e do MPMG é de que um novo termo para a reparação seja assinado com as mineradoras estabelecendo outro modelo de governança, similar ao do acordo da tragédia em Brumadinho (MG), sem a participação de uma entidade nos moldes da Fundação Renova.

Os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo também participam das tratativas e audiências públicas têm sido realizadas para ouvir os atingidos.

Edição: Maria Claudia

Fonte: EBC Geral

Comentários do Facebook

Educação

Em função da calamidade no Rio Grande do Sul, Governo adia Concurso Público Nacional Unificado

Publicados

em

A nova data será anunciada quando houver condições climáticas e logísticas de aplicação da prova em todo o território nacional

Em razão da situação de calamidade pública no Rio Grande do Sul, o Concurso Público Nacional Unificado (CPNU) será adiado em todo o país. A nova data vai ser anunciada assim que houver condições climáticas e logísticas de aplicação da prova em todo o território nacional. O anúncio foi feito na tarde desta sexta-feira, 3 de maio, pela ministra da Gestão e Inovação nos Serviços Públicos, Esther Dweck.

A decisão foi tomada de forma coletiva, após análise das condições no Rio Grande do Sul, em conjunto com a Advocacia-Geral da União (AGU), a Defensoria Pública da União (DPU) e a Procuradoria-geral do Estado do Rio Grande do Sul, além do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI). A oficialização da medida foi efetivada a partir de um Termo de Acordo (confira em anexo).

“Essa decisão de adiamento busca garantir a integridade dos participantes, inclusive sua integridade física nas regiões onde seria impossível o deslocamento. Mas é uma integridade em todas as dimensões, preservando a vida das pessoas e também conferindo segurança jurídica ao concurso, que é algo essencial para todo mundo que está prestando concurso”, afirmou Esther Dweck.

A ministra assegurou que nos próximos dias, após a resolução das questões logísticas envolvidas, será anunciada a nova data. “Não temos uma nova data. Eu quero deixar claro que podemos, nas próximas semanas, divulgar a nova data. Nesse momento, toda a questão logística envolvida com a prova não nos permite dar uma nova data com segurança. A gente imagina que algumas semanas, ou até menos, a gente consiga divulgar a nova data”, enfatizou.

A ministra Esther Dweck enfatizou que a solução é a mais segura para todos em todo o país, ao garantir as mesmas chances para todos os candidatos em todos os lugares. “O adiamento reforça o compromisso do governo com a construção de um país melhor, um país mais inclusivo, com respeito ao próximo e a construção de uma democracia com a cara do Brasil. Por isso a gente não pode deixar ninguém de fora”, declarou Dweck.

O governo ouviu a população gaúcha e decidiu pelo adiamento. O Brasil se solidariza com o Rio Grande do Sul neste momento de dificuldades e vai prestar toda ajuda necessária” Paulo Pimenta, ministro da Secom

EMERGÊNCIA – Para o ministro Paulo Pimenta, a decisão, além de garantir isonomia a todos os candidatos, permite ao Governo Federal focar ainda mais os esforços na ajuda humanitária necessária ao Rio Grande do Sul. “O governo federal ouviu a população gaúcha e decidiu pelo adiamento da prova em todo Brasil. O Brasil se solidariza com o Rio Grande do Sul neste momento de dificuldades e vai prestar toda ajuda necessária”, disse.

O ministro afirmou que o foco do Governo Federal está no resgate das vítimas e restabelecimento das condições básicas de infraestrutura, como desobstrução de vias e restabelecimento de serviços essenciais, como energia elétrica e comunicações. Ele destacou que, devido à continuidade das chuvas, ainda não é possível calcular o alcance total dos danos. “Isso é aquilo que chamamos de segunda etapa: trabalho de reconstrução. E esse levantamento dos valores se dará a partir do plano de trabalho apresentado por cada município e pelo estado, mediante homologação da defesa civil”.

Pimenta disse que não há um valor acordado, mas assegurou que o Governo Federal não estabelecerá um limite para os recursos e irá prover o suporte financeiro necessário para a reconstrução das cidades. “O que o presidente Lula afirmou ontem é que não há limite definido. Vamos disponibilizar o recurso necessário para que, nas questões de responsabilidade do Governo Federal, todos os pleitos de reconstrução sejam atendidos”, declarou. Pimenta e o ministro da Integração de do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, voltam neste sábado para o Rio Grande do Sul para instalar um escritório de governo no estado.

ENEM DOS CONCURSOS – Conhecido como Enem dos Concursos por sua abrangência, o Concurso unificado tem mais de 2,14 milhões de inscritos de todas as regiões do país. Eles vão concorrer a 6.640 vagas em 21 órgãos da Administração Pública Federal. Quando remarcadas, as provas devem ocorrer em 228 municípios de todos os estados e no Distrito Federal.

Comentários do Facebook
Continue lendo

MAIS LIDAS DA SEMANA