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“Santos Dumont era um homem brilhante e doce”, diz romancista holandês

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Não foi apenas a vida inventiva de Alberto Santos Dumont que chamou a atenção de um dos principais escritores contemporâneos holandeses – o romancista Arthur Japin, de 65 anos de idade. Uma história real após a morte do brasileiro trouxe enredo em formato de mistério ao romance histórico O Homem com Asas (The Winged Man), lançado há cinco anos

Japin soube que o coração do brasileiro foi retirado pelo médico Walter Haberfeld, que ficou responsável por tratar o corpo antes do sepultamento. O coração foi recuperado na década de 1940 e foi guardado em uma peça em exposição  no Museu Aeroespacial, no Rio de Janeiro. 

Os detalhes dessa intrigante história, segundo Japin, homenageiam a trajetória e os sentimentos do brasileiro, por quem o autor estrangeiro ficou impressionado. “Se a vida se esvai do coração, o coração se esvai da vida. A única maneira de fazê-lo bater de novo é buscando a história por detrás dele”, justifica Japin na obra.

Em entrevista à Agência Brasil, Arthur Japin considera que os feitos de Santos Dumont precisam ser permanentemente difundidos. “Acho que devemos saber mais sobre Santos Dumont, não só na Europa, mas em todo o mundo. Talvez meu livro tenha ajudado um pouco. Qualquer um que o leu agora sabe a verdade”.

Ao mergulhar na vida de Santos Dumont, o autor holandês também defende que o pioneirismo do brasileiro não deve ser colocado em dúvida. “Não tenho dúvidas de que este foi o primeiro voo de avião de todos os tempos. Toda Paris viu Alberto decolar, antes mesmo que alguém ouvisse falar dos irmãos norte-americanos Wright, cuja única testemunha é a irmã deles”, disse. “Ele era um homem que amava as pessoas e queria fazer do mundo um lugar melhor e mais amoroso”, completa. Leia a entrevista:

Agência Brasil: A respeito do voo com o 14-Bis, em outubro de 1906, você acredita que essa conquista extraordinária é suficientemente reconhecida pelo mundo?
Arthur Japin: Não tenho dúvidas de que este foi o primeiro voo de avião de todos os tempos. Toda Paris viu Alberto decolar, antes mesmo que alguém ouvisse falar dos irmãos norte-americanos Wright (cuja única testemunha é a irmã deles). Em meu livro, explico por que Alberto, uma vez que sua invenção foi usada para guerra e lançamento de bombas, não teve problemas com os americanos assumindo a “culpa” por inventar aviões. Mas sim, acho que devemos saber mais sobre Santos Dumont, não só na Europa, mas em todo o mundo. Talvez meu livro tenha ajudado um pouco. Qualquer um que o leu agora sabe a verdade.

Arthur Japin Arthur Japin

O escritor holandês Arthur Japin visita réplica do 14-Bis, localizado no Museu Aeroespacial do Rio de Janeiro  – Foto: Benjamin Moser/Direitos reservados

Agência Brasil: Como foi a pesquisa sobre este homem? Na sua opinião, o que marca essa personalidade de Santos Dumont? Do que é feito o coração dele?
Japin: Muito já foi escrito sobre ele. Então a pesquisa não foi tão difícil quanto às vezes pode ser. Há muito material fotográfico fascinante e até mesmo um pedaço de filme, mas é sempre comovente ver ou mesmo segurar algo que realmente lhe pertenceu. Uma visita à casa de Dumont, em Petrópolis (RJ), nos deu uma ideia de sua personalidade tímida, mas com espírito inventivo. Para mim, a coisa mais comovente que vi foi o pedacinho de papel em que – para um de seus fãs – ele desenhou suas invenções mais importantes e assinou com “minha família”. Um amigo nosso, (o escritor e historiador) Pedro Corrêa do Lago, é dono desse material e deixou-me segurar. Foi como tocar a alma de Alberto. No próximo ano, um livro será publicado sobre minha vida e trabalho e vou chamá-lo de Minha Família Inventada. Por causa do Alberto. Eu entendo o que ele quis dizer. As coisas que inventamos, suas máquinas, meus livros, são como nossa família.

Agência Brasil: Para um autor importante e famoso como o senhor, como faz para descobrir histórias como essa do brasileiro?
Japin: Eu não descobri. Elas me encontram. Parece um clichê, mas é verdade. É como se apaixonar. Se você tentar encontrar o amor, nunca o encontrará, mas se relaxar e esperar, ele chegará até você. O mesmo acontece com os personagens históricos que me fascinam. Um dia, lendo, viajando, me deparei com eles. Eles sempre têm a mesma coisa em comum comigo: forasteiros tentando inventar sua própria dignidade e seu próprio modo de vida. Nossos olhos, de alguma forma, se encontram através das eras e nossas vidas estão limitadas para sempre. Eles passam a fazer parte do Minha Famiglia (minha família).

Agência Brasil: Por que o senhor se interessou pela história do brasileiro Alberto Santos-Dumont?
Japin: Sou fascinado por histórias de forasteiros, pessoas que de uma forma ou de outra têm que lutar para encontrar seu caminho na sociedade. Todos os meus personagens principais, de uma forma ou de outra, não pertencem ao local em que estão. Não se sentem em casa em seu entorno. Eles têm que encontrar uma maneira de se fazerem amados e desejados pelo mundo. Alguns deles, como Santos Dumont, surgem com soluções espetaculares, como a invenção do avião. Assim que Benjamin Moser, meu sócio (biógrafo de Clarice Lispector e da Susan Sontag), me falou de Santos Dumont, soube imediatamente que tinha que escrever sobre ele. Minha primeira história, que escrevi quando criança, era sobre voar, e desde então aparecem no meu trabalho pessoas que estão tentando decolar. Então Alberto, como eu o chamo, era meu sujeito perfeito.

Agência Brasil: Como surgiu a ideia de falar especificamente sobre um episódio ocorrido após a morte dele?
Japin: Imagine o seguinte: o coração deste homem extraordinário e sempre muito sensível foi roubado. O seu coração, o centro do seu ser, a sede do seu amor pelos outros, o seu amor pela pátria. 

É um presente para qualquer autor. É tão bizarro, tem tanto drama, que achei um excelente ponto de partida para a história do próprio homem.  Assim que começo a falar de seu coração real, levo você para seus sentimentos, para os pensamentos e emoções de um homem brilhante e maravilhosamente doce. Quando finalmente vi seu verdadeiro coração, que ainda está guardado no Rio, eu chorei.

Agência Brasil: Cento e quinze anos depois do 14-Bis, como o senhor quer que as pessoas falem do Santos Dumont?
Japin: Como um homem que amava as pessoas e queria fazer do mundo um lugar melhor e mais amoroso.

Agência Brasil: O senhor acredita que depois da pandemia o mundo passará a valorizar mais essas conquistas científicas históricas? Quais são seus próximos trabalhos?
Japin: As pessoas aprendem muito pouco com as coisas que vivenciam. Então, eu acho que sempre precisaremos continuar escrevendo livros, fazendo arte, música e teatro para dizer ao mundo continuamente o que realmente importa. A pandemia finalmente deu a Benjamin Moser e a mim tempo para criar um cachorrinho. Seu nome é Basso. Escrevi um livro sobre ele e os cães com quem cresci, especialmente aquele que me criou. Devo muito a eles. Este livro, para crianças e adultos, acaba de ser publicado na Holanda e é um grande sucesso. Estou viajando pelo país – frequentemente com Basso. É a coisa mais divertida que já fiz. No livro, Basso vê Alberto Santos Dumont sobrevoar Paris. Veja, mesmo depois de todos esses anos, Alberto ainda está comigo.

Edição: Nathália Mendes

Fonte: EBC Geral

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Ação Social

No primeiro ano de governo, 24,4 milhões deixam de passar fome

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Insegurança alimentar e nutricional grave cai 11,4 pontos percentuais em 2023, numa projeção a partir de informações da Escala Brasileira de Segurança Alimentar (EBIA), divulgada pelo IBGE com base na PNAD Contínua

Cozinhas solidárias, programas de transferência de renda, retomada do crescimento e valorização do salário mínimo compõem a lista de ações que contribuem para a redução da fome no país. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

No Brasil, 24,4 milhões de pessoas deixaram a situação de fome em 2023. O número de pessoas que enfrentam a insegurança alimentar e nutricional grave passou de 33,1 milhões em 2022 (15,5% da população) para 8,7 milhões em 2023 (4,1%). Isso representa queda de 11,4 pontos percentuais numa projeção feita a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), divulgada nesta quinta-feira, 25 de abril, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O amplo conjunto de políticas e programas sociais reunidos no Plano Brasil Sem Fome, a retomada do crescimento da economia e a valorização do salário mínimo são alguns fatores que recolocam o país em lugar de destaque da agenda de combate à fome no mundo. Tirar o Brasil novamente do Mapa da Fome é do presidente Lula” Wellington Dias, ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome

Na coletiva de imprensa para divulgação do estudo, o ministro Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome), avaliou que o avanço é resultado do esforço federal em retomar e reestruturar políticas de redução da fome e da pobreza. “O amplo conjunto de políticas e programas sociais reunidos no Plano Brasil Sem Fome, a retomada do crescimento da economia e a valorização do salário mínimo são alguns fatores que recolocam o país em lugar de destaque da agenda de combate à fome no mundo. Tirar o Brasil novamente do Mapa da Fome é do presidente Lula”, disse.

Para o ministro, o grande desafio agora é incluir essas 8,7 milhões de pessoas que ainda estão em insegurança alimentar grave em políticas de transferência de renda e de acesso à alimentação. “Vamos fortalecer ainda mais a Busca Ativa”, completou Dias, em referência ao trabalho para identificar e incluir em programas sociais as pessoas que mais precisam.

PESQUISA — As informações divulgadas nesta quinta são referentes ao quarto trimestre do ano passado. Foram obtidas por meio do questionário da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA). O ministro lembrou que o governo passado não deu condições ao IBGE para realizar a pesquisa. Por isso, a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan) aplicou o EBIA com metodologia similar à do IBGE em 2022, quando o Brasil enfrentava a pandemia de Covid-19 e um cenário de desmonte de políticas, agravado por inflação de alimentos, desemprego, endividamento e ausência de estratégias de proteção social. Esse estudo chegou ao número de 33,1 milhões de pessoas em segurança alimentar grave na época.

A secretária extraordinária de Combate à Pobreza e à Fome do MDS, Valéria Burity, lembra que mesmo em comparação aos resultados de 2018, último ano em que o IBGE fez o levantamento formal, os números apresentados nesta quinta são positivos. À época havia 4,6% de domicílios em insegurança alimentar grave. Agora são 4,1%, o segundo melhor resultado em toda a série histórica do EBIA.

“Estamos falando de mais de 20 milhões de pessoas que hoje conseguem acesso à alimentação e estão livres da fome. Esses resultados mostram o acerto de uma estratégia de enfrentamento à fome que vem sendo empreendida pelo governo, que é apoiada tanto em programas sociais como na condução de uma política econômica que gera crescimento econômico, reduz desigualdades e gera acesso a emprego e renda”.

Esses resultados mostram o acerto de uma estratégia de enfrentamento à fome que é apoiada tanto em programas sociais como na condução de uma política econômica que gera crescimento econômico, reduz desigualdades e gera acesso a emprego e renda” Valéria Burity, secretária extraordinária de Combate à Pobreza e à Fome do MDS 

Valéria também destacou como ponto importante da estratégia de combate à fome a retomada da governança de segurança alimentar pelo Governo Federal, com garantia de participação social. “O presidente Lula e o ministro Wellington foram responsáveis pela retomada do Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional, a restituição do Conselho de Segurança Alimentar e da Câmara de Segurança Alimentar, com 24 ministérios que têm a missão de articular políticas dessa área. E, no fim do ano passado, foi realizada a Conferência de Segurança Alimentar e Nutricional”, relatou.

A secretária nacional de Avaliação, Gestão da Informação e Cadastro Único do MDS, Letícia Bartholo, ressaltou o retorno da parceria do governo com o IBGE. “Depois do período da fila do osso, em que o Brasil viveu muita miséria e fome, uma das primeiras ações do MDS nessa nova gestão foi buscar o IBGE para retomar a parceria e medir a insegurança alimentar dos brasileiros”, recordou.

SUBINDO – A proporção de domicílios em segurança alimentar atingiu nível máximo em 2013, (77,4%), tempo em que o país deixou o Mapa da Fome, mas caiu em 2017-2018 (63,3%). Em 2023, subiu para 72,4%. “Após a tendência de aumento da segurança alimentar nos anos de 2004, 2009 e 2013, os dados obtidos em 2017-2018 foram marcados pela redução no predomínio de domicílios particulares que tinham acesso à alimentação adequada. Em 2023 aconteceu o contrário, ou seja, houve aumento da proporção de domicílios em segurança alimentar, assim como redução na proporção de todos os graus de insegurança alimentar”, explicou André Martins, analista da pesquisa.

 

Dados apontam a evolução da segurança alimentar no Brasil

 

NOVO BOLSA FAMÍLIA — Entre os fatores que contribuíram para o avanço apontado pela pesquisa do IBGE, está o novo Bolsa Família, lançado em março de 2023, que garante uma renda mínima de R$ 600 por domicílio. O programa incluiu em sua cesta o Benefício Primeira Infância, um adicional de R$ 150 por criança de zero a seis anos na composição familiar. O novo modelo, com foco na primeira infância, reduziu a 91,7% a pobreza nesta faixa etária. A nova versão do programa inclui, ainda, um adicional de R$ 50 para gestantes, mães em fase de amamentação e crianças de sete a 18 anos.

BPC – O ministro Wellington Dias também ressaltou a proteção social gerada pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC), que garante um salário mínimo para pessoas aposentadas, pensionistas e com deficiência em situação de vulnerabilidade social. “Vale mencionar que o efeito econômico da Previdência e do BPC foi potencializado pelo esforço administrativo de reduzir as filas de espera para acesso aos benefícios”, disse.

MERENDA – Outra política de combate à pobreza e à fome, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) garante refeições diárias a 40 milhões de estudantes da rede pública em todo o país e foi reajustado em 2023, após cinco anos sem aumento.

PAA – O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) é um dos 80 programas e ações que compõem a estratégia do Plano Brasil Sem Fome. Ele assegura produção e renda aos agricultores familiares, com compra direta dos produtos para serem distribuídos na rede socioassistencial, de saúde, educação e outros equipamentos públicos. Com a participação de 24 ministérios, o Plano cria instrumentos para promover a alimentação saudável contra diversas formas de má nutrição.

ECONOMIA – No cenário macroeconômico, houve um crescimento do PIB de 2,9% e o IPCA calculado para o grupo de alimentos caiu de 11,6% em 2022 para 1,03% em 2023. É a menor taxa desde 2017.  O mercado de trabalho ganhou força e a taxa de desemprego caiu de 9,6%, em 2022, para 7,8% no ano seguinte. A massa mensal de rendimento recebido de todos os trabalhadores alcançou R$ 295,6 bilhões, maior valor da série histórica da PNAD-C.

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